Na disputa por uma vaga na final do basquete feminino da primeira divisão dos Jogos da Juventude CAIXA Brasília 2025, duas atletas se destacaram não apenas pela performance dentro de quadra, mas também pela forma de carregar suas identidades e estilos: Naomi Rosa Chagas da Silva, de São Paulo, e Raquel Maria Francisco Guimarães, de Santa Catarina, esbanjaram personalidade ao entrarem em ação com os cabelos black power e trançados, respectivamente.
E as meninas tiveram o exemplo reforçado fora das quadras. Sob os olhares da embaixadora e medalhista olímpica Janeth Arcain, figura icônica do esporte brasileiro que adota o black power como força e resistência negras, as duas atletas se destacaram no confronto das semifinais do basquete.

Mas afinal, o que define o estilo? Para muitos, é o conjunto de tudo que envolve uma pessoa: a forma de se vestir, de se movimentar, de falar e de ocupar espaços. No esporte não é diferente. Dentro e fora das quadras, estilo é aquilo que transcende a técnica – é identidade, é a maneira única como cada atleta se expressa em cada detalhe.
No basquete, essa palavra ganha um peso ainda maior. É sinônimo de resistência, de afirmação e de orgulho das próprias raízes.
Naomi Chagas e a potência de seu black power
Aos 17 anos, Naomi Chagas leva para a quadra muito mais do que o papel de pivô. A história com o basquete começou em Curitiba, aos 9 anos, quando o pai comprou uma cesta para brincar em casa. O hobby logo virou paixão e, em Brasília, ganhou experiência nos treinos com o tio Márcio. O talento abriu novos caminhos e, em São Paulo, Naomi passou a defender o São José Basquete, e acumulou conquistas importantes como o título Sub-17 e o vice-campeonato Sub-19 brasileiros.
Além do desempenho, sua presença também chama atenção. Ao entrar em quadra com o black power, Naomi transforma estilo em identidade – reafirmando seu orgulho e a força de ser quem é.
“Eu me sinto muito feliz em poder ser quem eu sou. Sei que muitas meninas têm vergonha de mostrar sua identidade, mas eu gosto de mostrar quem eu sou de verdade. Meu cabelo black faz parte disso: é representatividade, é orgulho, é força. Quando vejo meninas se inspirando em mim, isso me motiva ainda mais”, afirmou Naomi.

O penteado carrega um significado histórico. Surgido nos Estados Unidos nos anos 1960, o movimento Black Power tornou-se símbolo de afirmação da negritude e resistência contra o racismo. No Brasil, representa empoderamento: usar o cabelo natural é reivindicar espaço, quebrar padrões e celebrar a própria identidade.
“A Janeth é uma inspiração enorme para mim. Ve-la aqui significa muito para mim, porque eu consigo me ver nela. Ela tem a mesma fisionomia que a minha, usa o cabelo como eu uso, e isso me representa. Eu me inspiro muito nela e no estilo de jogo. Fico muito feliz por ela estar aqui prestigiando a gente”, disse Naomi.
Raquel Guimarães e a força de suas tranças
E a representatividade dentro de quadra não para por aí. Raquel, de 16 anos, também mostra que estilo é muito mais do que se vê. Suas tranças se tornaram marca registrada desde o início no basquete, em Santa Catarina.
“Minha tia fazia penteados na minha prima, um dia pedi para ela fazer tranças em mim e gostei muito. Na época ninguém usava em Santa Catarina, então acabou virando uma marca. Em toda competição importante eu entro em quadra de tranças, é como as pessoas me reconhecem. Não consigo jogar sem. Isso me ajuda, me representa e faz parte do meu estilo”, contou.

As tranças carregam ainda um forte significado de auto expressão e identidade cultural para as mulheres negras, que as utilizam como forma de afirmar autonomia e se conectar com suas raízes africanas e afro-americanas. Para Raquel, são símbolo de confiança e também de inspiração para outras meninas.
“Eu não consigo jogar sem tranças. Se não faço as grandes, preciso ter pelo menos uma trança pequena, lateral, algo que me caracterize”, comentou Raquel.
Janeth Arcain: embaixadora de um legado
Quem acompanhou de perto o desempenho das jovens foi Janeth Arcain, uma das maiores jogadoras da história do basquete brasileiro. Multicampeã, com medalhas olímpicas e títulos mundiais, ela viu em Naomi e Raquel a continuidade de uma luta que sempre fez parte de sua trajetória.
“Eu me sinto até inspirada, porque lembro da época em que eu tinha essa idade e sonhava em alcançar meus objetivos, de um dia poder defender a camisa do meu estado e do meu país. Estar aqui com essas meninas e ver que muitas delas têm o mesmo sonho é muito especial”, contou Janeth.

“A partir do momento em que você se aceita e se sente bem consigo mesma, você fica livre. O importante é valorizar suas raízes, porque muitas pessoas lutaram – e continuam lutando – para que os pretos possam ser eles mesmos. Ver a Naomi, por exemplo, usar o cabelo dela com tanto orgulho é muito legal. Isso mostra uma aceitação própria, individual, que quebra qualquer barreira e qualquer preconceito. E é bom ter esse tipo de inspiração, porque fortalece outras meninas também”, complementou a ex-jogadora.
O Basquete Feminino nos Jogos da Juventude
Nesta quinta-feira (18), o Maristão, em Brasília, recebeu as semifinais do basquete feminino. No duelo entre Santa Catarina e São Paulo, as sulistas levaram a melhor e venceram por 64 a 58. Nesta sexta-feira (19), as equipes voltam à quadra para a disputa das medalhas: Santa Catarina enfrenta o Paraná, que superou o Mato Grosso do Sul por 78 a 49, na final pelo ouro, enquanto São Paulo decide o bronze contra as centro-oestinas.